
Em vez de baú, relativo à guarda de objetos caros e finos, caçuá, que me traz lembranças da infância e da poesia popular cantada nas feiras de Santana e de Conquista, na Bahia. O caçuá é ambulante, roceiro, de conteúdo discernível pelas frestas do seu trançado – seus cipós formam paredes quase diáfanas, revelando objetos que contam histórias, incitam sensações, reavivam memórias... Baú é aristocracia sobre cavalo branco. Prefiro os caminhos desbravados pelo jegue.
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sexta-feira, 1 de junho de 2012
CHUVA NUNCA É ÁGUA PURA
Quando o céu põe-se a fluir,
desce um cheiro gostosinho,
raios, gotas de bolinhos,
barulhinho de dormir...
(2005)
sábado, 12 de maio de 2012
TROVAS INFANTIS PARA AS MÃES*
1.
Quanto mais o tempo passa
bem mais aumenta o frescor
do leite materno – uma Graça!
Mais que uma prova de amor.
2.
Quanto mais o tempo voa
minha mãe, anjo barroco,
muito mais se aperfeiçoa
– como o vinho, água de coco.
3.
É a minha mãe querida
como a mamãe de Jesus:
cuida das minhas feridas
quando encontro a minha cruz.
4.
Tanto amor!... Como é que cabe
em uma simples mulher,
tudo de bom que se sabe,
todo bem que se fizer?
5.
É como o calor do vento
acordando as sementinhas,
quando a imagem de mãezinha
deita no meu pensamento.
6.
Quisera ter duas vidas
para lhe dar uma delas,
minha eterna salva-vidas!
Ela em mim, eu dentro dela...
7.
Quero ter a Eternidade
pra doá-la à minha mama
pra que seja sua bondade
eterna, a todos que ama.
8.
Que bom se todos tivessem
uma mamãe como a minha...
Ai ai ai... se eu pudesse
dava várias, i-guai-zinhas!...
9.
Divertida aqui em casa,
quando queremos brincar,
minha mamãe sempre arrasa
se a injustiça encontrar.
10.
< >
pra todo mundo...
para mim é só... Bondade.
Bem lá no fundo, no fundo,
é seu nome de verdade!
___________________________
* A brincadeira de hoje, dirigida especialmente às crianças,
é recitar essas trovas para a mamãe, depois de colocar o nome dela no espaço da
trova número 10.
Modifiquei um pouco essas trovinhas, pois a versão original
foi feita para nossa filha caçula Mariana (então com 9 anos) ler para a sua
mãe, Elisabeth. Isso aconteceu no Colégio Amor Perfeito, Campo Grande, em 2001.
O Original continha a trova abaixo:
A vida fica sem graça,
o carnaval sem confete,
se em minha mão o tempo passa
sem a mão de Elisabeth.
terça-feira, 3 de abril de 2012
sábado, 24 de março de 2012
O QUE É UMA TROVA?
I.
Sete sílabas medidas,
quatro versos bem rimados,
uma idéia, um fim, um achado...
poesia comprimida.
______________________________________________
II.
Sete sílabas que fiam
quatro linhas bem tecidas...
Uma idéia em si retida,
costurada com poesia.
quatro linhas bem tecidas...
Uma idéia em si retida,
costurada com poesia.
______________________________________________
III.
É como um pouco de vinho:
se não tem alma, labor,
e um peculiar sabor,
não é trova! São... versinhos.
se não tem alma, labor,
e um peculiar sabor,
não é trova! São... versinhos.
______________________________________________
IV.
Não é sorte nem ciência
nem matéria, nem ausência...
É palavra arquitetada,
de poesia recheada.
nem matéria, nem ausência...
É palavra arquitetada,
de poesia recheada.
______________________________________________
V.
Não é pedra mal cortada
pelo grosseiro esmeril.
É palavra lapidada
pelo insistente buril.
pelo grosseiro esmeril.
É palavra lapidada
pelo insistente buril.
______________________________________________
VI.
Não é dessas encontradas
em quadras da meninada...
É palavra garimpada,
poesia lapidada...
em quadras da meninada...
É palavra garimpada,
poesia lapidada...
sexta-feira, 23 de março de 2012
O MAR (55 trovas populares)
1.
2.
A tormenta entra no cio
e dança com o vento frio
quando o mar tem arrepios
provocados pelo rio.
3.
Todo dia, após o açoite
do vento no sol vazio,
todo mar, todas as noites
é o sono de todo rio.
4.
A poesia é desperta
quando o mar é penetrado
– na nua praia deserta –
pelo rio quente, cansado.
5.
Há profunda calmaria
no ventre da brisa quente
quando o mar, doce, vigia
o leito do rio dormente.
6.
O mar espanta a tristeza,
desmancha as coisas ruins
e refaz toda beleza
que se desprende de mim.
7.
O mar fertiliza a História
enche cada dia de glória
pois tempera a humanidade
desde as primeiras cidades.
8.
Se o mar não está para peixe,
fique tranquilo. Então deixe
que se faça da poesia
diferente pescaria.
9.
Mar: fecundo precipício
fincado na escuridão.
Líquido alimentício
da vida em evolução.
10.
Mar: fecunda superfície
deitada na claridade
que transforma as imundícies
em verde longevidade.
11.
É o mar cadente véu.
É o brilho que descerra
o céu no espelho da Terra
– fim e princípio do céu.
12.
É o mar eterna fonte
dos poetas aguacentos
de rumos, ondas... sedentos
de infindáveis horizontes...
13.
É o mar céu debruçado
pelo teu deslumbramento.
É o anil precipitado
por sensível pensamento.
________________________________________
[Seção Os sentidos]
[Gustação]
14.
Sedento da água salgada
neste planalto cerrado,
bastaria-me uma pitada
para eu ficar mareado.
15.
Com fome de litoral
neste Planalto Central,
busco o sal nas lanchonetes
das ondas da internet.
[Olfato]
16.
Deitado na terra quente
penso que minhas narinas
são poços secos, carentes
do cheiro azul das marinas.
17.
Folhas caídas na lama...
Cheiro bom de maresia...
Vive a sulfídrica cama
da síntese de poesia?
18.
O gás de ácido nome
corrói a matéria viva,
ou é o tempo que consome
a matéria reativa?
19.
O vento leva a lembrança
do mangue reelaborando
a matriz da substância
viva, que vai... caminhando!
20.
O vento é o rastro do dia,
o espaço-tempo na via...
Faz piruetas com o ar,
muda o tempo de lugar...
21.
O vento é o rastro do dia.
É o espaço translocado
para o vácuo que seria
por outro espaço ocupado.
22.
O vento é um grande avião,
muda o espaço de lugar:
leva, ao mar, seco sertão
e, ao sertão, frações de mar.
23.
O céu é matéria errante
– apesar das evidências.
Erra quem não tem ciência,
erra quem vive distante...
[Tato]
24.
O tempo molda o momento
segundo a necessidade.
Fibra em morno sedimento
deixa o tempo sem vontade!
25.
Traças descrevem o momento
do tempo e do temporal
nas folhas do sedimento
que cultiva o manguezal.
26.
Feito um íntimo carinho,
a luz dourada descerra
a pele verde da terra
e o vento alisa o marinho...
27.
Noite mal dormida. A vaga
tocando a praia que traga.
É ressaca. É o arrepio
da onda em manhã de frio.
28.
Tateio as curvas da praia
deste rio Aquidauana...
Quase em terras paraguaias
sinto em mim... Copacabana!
[Visão]
29.
Queria ter uma janela
neste céu do Pantanal
para dar uma olhadela
no verde do manguezal.
30.
Nas fazendas alagadas
o saudoso ribeirinho,
com as pupilas mareadas,
busca cavalos-marinhos.
31.
Descortinando a janela
que mostra um seco caminho,
negras retinas são tela
carente do azul marinho.
32.
Vejo nas secas pupilas,
neste tórrido altiplano,
poços de luz – clorofila –
dentro do azul oceano.
33.
Olinda, se você for
num mergulho Salvador
às pupilas dos meus olhos...
cuida os Recifes. Abrolhos.
[Audição]
34.
Com o ouvido ressecado?
É meu desejo melhoras:
recomendo ouvir um fado
nas azuis ondas sonoras.
35.
O derradeiro sentido
a morrer é a audição...
Quero morrer no estampido
grave da arrebentação!
[Sexto Sentido]
36.
Sob a cama de aguapés
deste Mar dos Xarayés
pressinto um pétreo oceano,
morto há seiscentos mil anos.
37.
Há, sempre, portos seguros
depois do horizonte escuro
quando se busca o incontido
clarão do sexto sentido.
________________________________________
[Seção Música]
38.
O mar abriga tesouros
que só compram o que é sublime:
é o primeiro logradouro
das cantigas de Caymmi!
39.
Certas peças musicais
são uma gema, água-marinha:
preciosas, imortais,
já nascem prontas, limpinhas...
40.
Há pérolas musicais
que, de natureza rústica,
nascem em modestos corais,
dentro de conchas acústicas...
41.
De tão nobre, a “Princesinha
do Mar” foi presenteada
com uma pérola criada
por nosso nobre Braguinha.
42.
É no mar que nascem os fados?
Na despedida do amado?
Tão pouco sei! Investigue
a voz de Amália Rodrigues!
43.
Foi do mar que veio a vida,
da evolução comprida:
eras, mil tons, nascimentos,
feito Miltons Nascimentos.
44.
Nasce o mar no pensamento
da cantiga popular,
pela voz do Nascimento,
“quem me ensinou a nadar...”.
45.
Tom procurando paisagens!...
Tom eternizando o Rio
que é mar/avilha, miragem...
a paisagem no cio.
46.
A praia refaz suas cores
nos adornos populares
cantorias e tambores
das congadas de Linhares.
47.
O banzo do mar se acaba
quando as praias capixabas
vestem-se de cores, jongo,
ligando o Brasil ao Congo.
________________________________________
[Seção “Eles passarão. Eu, passarinho”.]
48.
Quisera saber domar
um galope à beira-mar...
Sem esforço elaborar
poesia popular...
49.
Quisera saber voar...
Frente à grandeza do mar
com asas de passarinho
fazer versos miudinhos...
50.
Quisera saber toar,
improvisar meu mundinho,
pôr um martelo miudinho
na cadência deste mar...
51.
Quisera fazer versinhos
com a pena do passarinho
Patativa do Assaré,
na brancura da maré.
52.
Que meus versos mareados
– que se querem agalopados –
apeteçam-se do ninho
do poeta-passarinho.
53.
Disse o bardo do além-mar,
nos seus versos tão precisos:
é preciso navegar
– sim! –, viver não é preciso.
54.
Disse Mário, do Guaíba:
passarão. Eu, passarinho.
Respondeu-lhe rapidinho,
do Assaré: eu, Patativa.
55.
Era a mini patativa
do Assaré – um rio pequeno...
Tornou-se gaivota... altiva...
rumo ao oceano pleno.
(2002)
quinta-feira, 15 de março de 2012
PARA TOMAR TERERÉ
Uma guampa artesanal,
água bem fria, erva-mate,
um tubinho de metal
e um amistoso debate.
(trecho do poema Jogando Conversa
Fora - ver íntegra em http://paulorobsondesouza.blogspot.com.br/2012/04/jogando-conversa-fora-causos-do.html)
domingo, 5 de fevereiro de 2012
O FÓSSIL
Num átimo o tempo gessa
A face dolente, nua.
Mas, com o tempo, se habitua
A deixar marcas sem pressa.
(2005)
sexta-feira, 3 de fevereiro de 2012
segunda-feira, 9 de janeiro de 2012
METAFÍSICA?
Ao poeta Sidnei Olívio
Há vazios na mais densa matéria.
* * *
O tempo que se vê já passou.
* * *
O fim de toda estrada
é a partida.
* * *
O nada não é, nada,
absoluto.
* * *
Desde o dia que nascemos
morremos mais um pouco.
* * *
A eternidade é uma porta emperrada
que guarda o silêncio
e dá para o nada.
* * *
A morte não é passagem:
é compostagem.
* * *
Desde o princípio bebo manhãs porque me faltam madrugadas.
* * *
O oco é o justo descanso
da matéria dura, densa
como se pluma de ganso
sobre a água morna, tensa.
* * *
Mesmo na matéria quente,
densa, viva ou encorpada
há vazios persistentes
lembrando que o tudo é... nada.
* * *
Ei, você, não se apoquente,
não se prenda ao que passou ―
o passado é o presente
que se deteriorou.
* * *
Chegar é o sonho da estrada.
O fim-de-estrada é partida.
A vida é negar o nada.
O fim da morte é a vida.
* * *
Viver é negar o nada
postergando a despedida.
A morte é uma curta estrada
― pausa pra novas partidas.
* * *
Existem ocos sensíveis
no mais denso dos xilemas,
como há versos invisíveis
nos espaços dos poemas.
* * *
Há rimas mal disfarçadas,
há luzes pouco visíveis
no escuro quadro sensível,
no puro branco do verso.
(janeiro de 2005)
sábado, 24 de dezembro de 2011
PLANOS
Meu traçado é a minha escolha: dia a dia determino, com meu sangue em branca folha, a linha do meu destino.
(fev 2005)
(fev 2005)
sexta-feira, 23 de dezembro de 2011
O FÓSSIL
Num átimo o tempo gessa
A face dolente, nua.
Mas, com o tempo, se habitua
A deixar marcas sem pressa.
quinta-feira, 22 de dezembro de 2011
(TROVAS SOBRE OS INSTRUMENTOS DO CHORO)
1.
Notas certas, moduladas
Saltitando em correria...
Alegres, extasiadas,
Numa grande confraria.
2.
Sopra a flauta sibilante
No choro, a simbolizar
Avezinhas saltitantes,
Tico-ticos no fubá.
3.
O trombone, em harmonia
Dá ao choro um tal vigor
Que parece que anuncia
A descida do Senhor.
4.
Ponteando com o dedão
Sete cordas renitentes,
Sai do grave violão
Um choro alegre, pungente...
5.
Um violão diferente:
Com uma corda a mais, bem
grave,
Dá o tom, o pulso quente
À melodia suave...
6.
Ai Jisuis, o bandolim
É saudade original:
O luso que vive em mim
A choraire um Portugal.
7.
Um cavaquinho a solaire
Tão magistralmente assim,
Traz lembranças do além-maire
Ao solo tupiniquim.
8.
O africano ganzá
Põe o banzo porta afora:
Num alegre chocalhar
A saudade vai-se embora.
9.
Quando um chorão, carinhoso,
Toca o sax lindamente,
Vem do céu um sopro airoso
Do “menino bom” na gente.
10.
Quando um sax é tocado
Por quem o choro acarinha,
Toca um ser iluminado
Na alma de Pixinguinha.
11.
O trompete faz firulas
Celestiais no chorinho.
Quando sobem notas puras
Anjos caem, devagarzinho...
12.
É raro o grande oboé
Pôr o choro em seu destino.
Quando o faz, parece até
Obra do sopro divino.
13.
Se, num samba apaixonado
Se percebe um tamborim,
É meu coração, coitado,
Sorrindo dentro de mim.
14.
O violão é a base
Em que o choro se apoia.
Suas harmônicas frases
São os flancos de uma joia.
15.
Das arábias o pandeiro
Trouxe o percutir dos grãos
Das areias nos carneiros
— luxuosa percussão.
16.
No guisar das platinelas,
Ao bater o firme couro,
Pandeiros curam mazelas
Nos baticuns duradouros.
17.
O clarinete chorado,
Ao costurar notas puras,
Assanhado, faz bordados
Espargindo alta costura.
18.
Quando um choro rompe a
aurora
Timba e vassourinha,
atentos,
Varrem a trilha sonora
Para um gostoso andamento.
19.
Quando o choro, triste,
chora?
Quando, insone, se supõe
Nos tempos do Rio de outrora,
Do ophicléide e
lampiões...
20.
Violão, sax, pandeiro,
Timba, flauta, cavaquinho...
Bem seriam o amor primeiro
De todo brasileirinho.
(fev 2005)
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