segunda-feira, 24 de julho de 2017

LILICA

Letra e música:  Paulo Robson de Souza


Chegou em casa e fez
de mim história de amor...
O seu silêncio mais
falava
no seu corpo
no pulsar
no calor...

Bastou um afago, um sim, 
um dengo, um olhar... Gemer
no descansar do som
pra sua vida,
o seu ventre oferecer
a mim.

A vida é sonho e diz
que fica o que se dá e se percebe...
Da vida, um sonho diz
que dura o dom que se recebe
na mente.

Grande ilusão
voltar pra aonde o tempo não vai mais estar...
Lilica, onde estará você?

Lilica... Onde estará?

(solo)

Chegou em casa e deu
o amor todo... Incondicional
Quis ser amada e amar
de um jeito
quase gente
quase deusa
quase animal.

Hoje a saudade tem
morada neste velho ser...
Hoje o silêncio diz
que o meu silêncio
é a pura voz
do não dizer...


A vida é sonho e diz
que fica o que se dá e se percebe...
Da vida, um sonho diz
que dura o dom que se recebe
na mente.

Grande ilusão
voltar pra aonde o tempo não vai mais estar...
Lilica, onde estará você?

Lilica... Onde estará?


O dom de amar por amar...


       (falado)
Como eu queria voltar (!)


No tempo...




(julho de 2017)

terça-feira, 18 de julho de 2017

VITÓRIA-RÉGIA

           

“Uma flor é uma flor,
uma rosa é uma rosa”
mas a vitória rosa
é régia.

Uma flor que um dia é branca
feminina flor
refletindo a luz do dia.
Masculina flor noturna
agora é rosa
como o fim da tarde
de uma longa espera.

Regendo o tempo,
o fluxo do rio...
 — Determina as cheias
ou a cheia lhe insemina?

Uma flor que me ensina
que o branco
contém o rosa
e todas as cores do dia.
Que a noite
contém o dia.

Uma flor que é menina
e menino brincando n’água.


                      


               
(Do livro Síntese de Poesia,
Paulo Robson de Souza, 2006)
 


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Com folhas circulares flutuantes que chegam a ultrapassar dois metros de diâmetro, a vitória-régia é a maior planta aquática do mundo. O nome científico, Victoria amazonica, é uma homenagem à rainha Vitória, da Inglaterra, e porque a planta é típica da Amazônia   embora ocorra também na porção norte do rio Paraguai, até o município de Corumbá, MS, onde a foto abaixo foi feita. 

Dependendo da região, os ribeirinhos a conhecem por aguapé-açu (do tupi, aguapé grande), forno-d'água e milho-d'água, porque produz sementes arredondadas, comestíveis,  ricas em amido que lembram  milho de pipoca; e cará-d'água, porque tem um rizoma 
comestível que lembra o cará (é quase do tamanho de uma bola de futebol e possui reservas nutritivas  que permitem à planta rebrotar após o período de seca).

Embora seja monoica, ou seja, possua os dois sexos no mesmo indivíduo, para evitar a autofecundação  as partes femininas localizadas na flor tornam-se férteis uma noite antes das masculinas; nesta fase inicial, feminina, as pétalas têm coloração branco-creme, e na noite seguinte, a fase masculina, as pétalas ficam róseas.  


A fecundação é um fenômeno muito curioso, do ponto de vista ecológico: ela é feita por um besouro amarelado (
Cyclocephala castanea) que, ao comer as partes florais, leva o pólen das partes masculinas de uma flor velha (foto) para as estruturas femininas da flor recém aberta, realizando a polinização. Mas quando ele visita a flor recém aberta (feminina), esta se fecha e o besouro fica aprisionado até o outro dia.

Embora aparente ser totalmente flutuante, a vitória-régia é fixa ao substrato:  suas gigantes folhas são, na verdade, sustentadas por um longo pecíolo cujo comprimento aumenta à medida que o nível da água sobe, uma adaptação à alternância de ciclos de cheia e seca. 

Saiba mais:

Plantas Aquáticas do Pantanal
, livro de Vali Joana Pott e Arnildo Pott (Embrapa, 2000) 

e artigo
Morfologia da flor, fruto e plântula de Victoria amazonica (Poepp.) J.C. Sowerby (Nymphaeaceae), de Rosa-Osman et al, 2011 (cliqu no link para acessá-lo).

MAL-ENTENDIDOS?





Urutu, cobra bendita
pela cruz que tem na testa.
De dia dorme, medita...
e de noite faz a festa.

Tendo um cruzeiro na testa,
ela é linda como a luz
desde que se fuja desta
como o diabo da cruz.

Urutu, cobra marcada,
é bonita de se ver
ou maldita, essa malhada,
se te bota pra correr!?

“Cabra” marcada,  se vê
detenta do nosso erro.
Traz a cruz do próprio enterro.
É marcada pra morrer.

Urutu, injustiçada
serpente, tão maculada...
linda de viver – é vida!
Linda de morrer. Decida.


                 Paulo Robson de Souza 
                 (O Livro das Cores e Formas, 2001, inédito)

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Adendo 01/4/2019:

O parceiro Raimundo Galvão musicou este poema. Clique na imagem para ouvir.




segunda-feira, 17 de julho de 2017

É E NÃO É



No Pantanal certas vidas
lembram coisas de comida.
Dá vontade de brincar,
as palavras cozinhar...

fazer uma sopa de nomes
um jogo do que “se come”,

exercitar a lembrança,
olhar a vida com a pança.


Pau-d’alho lembra tempero.
Salsaparrilha também?
Louro-preto: flores brancas
que temperam o ar... mazém?

A baía é uma sopa só:
no raso tem cebolinhas.
Tem lentilha, alface d’água,
batata d’água, salsinha...

E, bem longe do Urucum,
não achei sal na salina.
Suei, no Morro do Azeite,
pra fritar minha corvina!

São plantas que dão “comida”:
pata-de-vaca, faveiro,
assa-peixe, canjiqueira,
farinha-seca, leiteiro.

Bichos com nome gostoso:
palmito, peixe-banana,
tem também a rã-pimenta
e o araçari-banana.

A pimenta-de-macaco
tem, no fruto, pó-de-mico?
E a linda rã-pimenta,
canta os versos que fabrico?

E assim, nessa brincadeira
do que é do mato e da feira,

reconstruindo o poema,
tendo os seres como tema,

acrescente novos nomes
de tudo que não se come
mas entra no cozinhar...


para o jogo continuar...


               Paulo Robson de Souza
               2001, O Livro dos Jogos (inédito)