domingo, 18 de dezembro de 2016

ASAS

Para Janet I. Zimmermann




I.
Livro aberto como asas
voa do sul
ao centro
oeste.

Poemas e poemas são espalhados
sobre ramos, cerrados, espaços, regaços –
barcos de papel.


II.
Hoje, acordou no meu quintal a mesma manhã. A mesma embaúba. Os mesmos pássaros. O mesmo sol.
Mas dessa vez os pássaros eram flautas. Flautas que cuspiam desejos de florestas.





III.
Flautas andinas
e o baticum do tambor.
Nos escritos cuidadosamente caligrafados
há ritmo. Planícies e cordilheiras se fundem. O hálito morno do brejo e a neve eterna
ligados pelas asas
de animais de penas e
seres
que têm uma pena nas mãos.

O condor
pousa sobre mim. Desejo de ler em voz alta
arritmias e incongruências do verbo.



IV.
Quem tanto deu céu e voz a pássaros
e teceu,  rêmige empunhada, palavras rumo ao infinito,
tem as próprias asas cortadas
por quem não sabe voar.


Paulo Robson de Souza

Recife, 25.7.2014
C. Grande, 3 e 11.8.2014
(Da série Poesia Todo Dia)




DE COR


Janet gostou do nosso rascunho de música. Também pudera: quando o texto é bom, do tipo desenterrado da mais profunda fibra do coração, não há coração que resista. 

O provisoriamente denominado Trio “U” – formado pelos intrépidos compositores Lu, Du e PaulinhU –, assim que leu o poema dedicado à sua filha, logo se embrenhou no jardim de infância das cantigas de roda e acalantos, em busca de uma flor especial.

Amor à primeira vista foi o que aconteceu quando Eduardo e Luciana abriram praticamente juntos os dois exemplares de Asas de Jiz* e encontraram, ao mesmo tempo, o poema Minha Flor Especial. A primeira parte do acalanto foi composta em instantes! Coincidência? Ou coisas do coração?


Paulo Robson de Souza

Sorocaba, 26.8.2014


(Da série Poesia Todo Dia)

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*Zimmermann, Janet. Minha flor especial. Asas de Jiz. Life, 2014.

segunda-feira, 5 de dezembro de 2016

O METABOLISMO DAS COISAS III



Em dias de chuva a madeira morta, com saudade de seivas, ganha uma sobrevida e inspira a água do céu.

*   *   *

Pedras rolam de alegria, feito crianças, em dias de enxurrada.

*   *   *

Nas primeiras chuvas os quintais bafejam actinomicetices. Preferia desconhecer este fenômeno microbiológico (há muito descrito pela ciência) e, somente, sentir o cheirinho de terra – mesmo estando distante dela. Inclusive para não ter de usar este palavrão...

*   *   *

Das coisas, os muros velhos e brancos são os que mais se beneficiam com as gotas que caem do céu. Fotossintetizam.

*   *   *

Troncos mortos, revividos pela umidade, se coçam por inteiro ante o caminhar dos mixomicetos em sua pele vegetal.


Paulo Robson de Souza
20.3.14 Da série Poesia Todo Dia

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domingo, 4 de dezembro de 2016

IRRESPONSÁVEL




Da irresponsabilidade premeditada de descumprir prazos, chutar o balde da academia para compor um samba, nada mais humano há. Ontem à noite, reunido com Eduardo, Beth, Deise e Marco Antonio, num frio lascado incomum de abertura de outono lá nos fundos de casa (o denominado “redário”), depois de compormos a terceira música popular – uma canção brega, uma quase bossa e um sambinha pretensamente popular – fui dormir com o gosto bom de ter composto uma daquelas gracinhas que remete aos Originais do Samba. Sem compromisso, pura alegria e disposição de ligar a antena captadora de sinais que só quem se dispõe a criar possui.


Paulo Robson de Souza

23.3.14
Da série Poesia Todo Dia

TURMINHA TIC




Bobagem quem acredita que professor é o que ensina. Ultimamente, por causa da animação da turma TIC Biologia, do encantamento que se desprende dos olhos dessa gente feliz e das possibilidades que ela demonstra – ao querer produzir áudios, pequenos vídeos, músicas e outros materiais para o ensino de biologia –, tenho em mim renovado o gosto pela docência. Depois de quase três décadas lecionando, e de uma pausa de anos e anos afastado do curso de Licenciatura em Ciências Biológicas, é como se fosse a primeira vez que entro em sala de aula. Reviver com a vida, crescer com os alunos, se abrir aos novos tempos: ensinar aprendendo.



Paulo Robson de Souza

2.4.14
Da série Poesia Todo Dia

FIASCO MUSICAL-TECNOLÓGICO



Ensaiei “Primaveril” a manhã inteira, a parte tocada pela flauta, mas à noite deu tudo errado. O maior fiasco pessoal dos últimos anos, essa brincadeira que fiz de gravar uma música ao vivo diante dos alunos, usando somente o Audacity (um programa de edição de áudio) e o notebook, para demonstrar quão fácil, amigável e caseiro é este programa. 
Tudo começou com uma escolha errada do andamento da música Greensleeves (pelo metrônomo do programa), o que me levou a uma percussão horrível, pandeiro ridículo (deveria ter levado a percussão pronta!); tão ruim e incompleta que me desconcentrou na hora de tocar a primeira voz (flauta doce), que por sua vez gerou apitos e risos, meus e da turma, na hora de tocar a segunda voz.
Diante dessa base mais inconsistente que areia movediça, a aluna-cantora Cleide Oliveira (que tanto ensaiou, após meu pedido de véspera) teve de improvisar, e foi quem salvou a “performance”.  Tanto ensaio para nada, porque me faltou a escolha de uma providência caseira ― que seria gravar uma base antes, a própria percussão, quem sabe “garantir” a segunda voz de flauta, pelo menos.
Bem, que essa “aula” sirva de lição à turma de Tecnologia da Informação para o Ensino de Biologia, a TIC Biologia, algo do tipo “mesmo que fique ridículo, faça. Melhor que não fazer nada.” Ou: “todo ensaio vai por água quando o começo da apresentação for mal dimensionado”. Ufa! Preciso me apegar a alguma justificativa urgentemente...

Paulo Robson de Souza

26.3.14
Da série Poesia Todo Dia

ALTERNÂNCIAS



Sempre assim: depois da ânsia
vem o frio.
Finda a raiva
vem o cio.
Depois da crise
vem o vazio.



Paulo Robson de Souza


7.4.14
Da série Poesia Todo Dia

sábado, 3 de dezembro de 2016

MARCO ANTONIO CARSTENS, O IMPERADOR DA AMIZADE



(Samba de Enredo - clique na capa do CD para ouvir)

Autores:  Paulo Robson de Souza, Geraldo Damasceno e Heitor Correa

Intérprete: Áttila Gomes



                 (Refrão)


                 Marco Antônio é o amigo irmão

                 A gema do Homem, o império do humor
                 Marco Antônio é a definição
                 Do mais forte abraço, grande benfeitor.


Leais parceiros desde muito novos, 

encantados com o samba
e com os pequenos chorões 
“Velhos Camaradas” com veio Tito, o “capitão”
renovando o cavaco, 
a flauta e o violão 
de sete cordas amarrando a percussão. 
Eram os anos setenta
na escola reunião  
com Marco, Elton, Herbert, Paulinho e Heitor
homens-meninos
palhaçadas, diversão...
O inalcançável mundo feminino 
era o assunto que ligava
esse grupo genuíno.  


Capa do CD


Trilhando rumos diferentes do saber

os cinco amigos se encontram muito mais
nos festivais de música 
mosqueteiros do som
quase profissionais. 

Um novo encontro estudando violão

com Silvio Paes, o saudoso professor
e grande propagador
dos toques de bordão
tradições de valor.

                 Marco Antônio é o amigo irmão

                 A gema do Homem, o império do humor
                 Marco Antônio é a definição
                 Do mais forte abraço, grande benfeitor

Na faculdade de veterinária,  

Marco Antonio e Heitor
se encontram outra vez
nos congressos, corredores e no encantador 
fabuloso coral 
memórias de valor. 
Na alegria da “moagem”, diversão
música brasileira
com cavaco e  violão
Semana de Neuroanatomia era “moagem” 
pra turma inteira...
Cantoria e erudição:
a moda era a roda modulando 
a MPB, um contraponto 
entre a arte e o saber.

Ao encontrar Thimóteo e mestre Assis, 

o amigo Áttila,  Positivo, o Ildenor
com Agemaduomi, o regional
Marco eleva aos céus
o nível musical.
Andrologia é sua profissão
enquanto toca cavaco e violão 
e o grande  especialista 
o mestrado conquista:
mestre em reprodução!

                (Refrão)


De uma turuna conquistou um avião

mas seu voo maior
foi chegar ao coração.
Os cúmulos da vida firmemente atravessou
e depois encontrou 
sua maior paixão
a maior das riquezas, a gloria maior
de quem ama e se dá,
de quem faz uma canção:
Marco Antonio, Paula, Isabela e Margarete,
a família...
E, por causa da união,
nem o infarto nem a endocardite
− acredite − derrubaram 
o seu grande coração.

Laiá laiá laiá laiá laiá  (...) 



                Marco Antônio é o amigo irmão

                A gema do Homem, o império do humor
                Marco Antônio é a definição
                Do mais forte abraço, grande benfeitor.

                Marco Antônio é o meu caro irmão

                A gema do Homem, o império do amor
                Marco Antônio é a definição
                Do mais forte abraço, assinado: 
                Heitor.


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Ficha técnica:

Autores:  Paulo Robson de Souza, Geraldo Damasceno e Heitor Correa

Intérprete: Áttila Gomes


Coro: 

Camila Emboava Lopes
Denise Campos
Geraldo Damasceno
Luciana Amaral
Paulo Robson de Souza

Músicos:

Áttila Gomes (voz, surdo, pandeiro, tamborim, apito)
Geraldo Damasceno (violão)
Heitor Correa (violão, cavaquinho)

Gravação, mixagem:

Odon Nacasato


Gravado no Studio Vozes (Campo Grande, MS) em março de 2013


Contracapa do CD

Rótulo do CD

segunda-feira, 28 de novembro de 2016

NECESSIDADES



Água quando se tem sede. Cama para quem se esgotou ou quer esquecer. Um pão dormido basta para a profunda fome. Na solidão, mãos.

* * *

Os rituais matutinos. Não consigo me desprender deles. É como estar dormindo sentado, se eu acordar e não praticá-los. Primeiro o banho, a barba, algum exercício fuleiro no banheiro para aprumar a coluna; depois o preparo do café, os cuidados com os cães, e beijo de despedida e a solidão das paredes...
* * *

Janelas emolduram oportunidades, disse mais ou menos assim outro dia. São saídas mais que entrada de luz e de ar e de canto de pássaros. Janelas são as narinas das residências. Pontos de escape de pontos de vista.


* * *

A geladeira não é somente um item para conservar alimentos. É mais um divã na vertical, onde deitamos os olhos em busca de conselhos que aplaquem nossas angústias e ansiedades.

* * *

O sexo é uma necessidade cromossômica.

* * *

Em busca de orifícios, o gênero masculino segue a retidão. E parece que quanto maior a retidão, maior a necessidade.

* * *

Algumas pessoas pintam os cabelos. Outras os descolorem e chamam isto de “luzes”. Umas passam titica de galinha na careca, para adubar os folículos mais mortos que múmia chinchorra. Outras extraem os pelos, um por um. Há as que se beijam no espelho, enquanto outras nem passam perto dele, para não esquecerem a imagem viçosa da juventude. Umas gostam de ver, outras de serem vistas – nuas. Há o caso famoso do nanico ditador que usa sapatos com plataforma maior que a própria tíbia; enquanto uma amiga grandona – juro que é verdade – há anos usa rasteirinha porque ouviu de uma colega (certamente baixinha!) que sua estatura era impositiva. Já o meu pai, seu Jaime, penteia os bigodes e planta bananeira na praia desde muito antes do nascimento dos netos.
Algumas dessas necessidades me cabem bem. Mas o que não consigo entender é a necessidade que algumas pessoas têm de contar dinheiro em público, uma espécie de exibicionismo “financial”, em vez de sexual. Parece que o poder de compra as fazem maiores, sei lá...


Paulo Robson de Souza
26.11.2014

Da série Poesia Todo Dia

domingo, 20 de novembro de 2016

ACADÊMICOS UNIDOS DO RIO (Samba da Piranha)

Autores: Marco Antonio Carstens Mendonça / Paulo Robson de Souza 
Intérprete: Áttila Gomes


(Clique na imagem  para ouvir)






(com CD encartado), 2011

(capa aberta)

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Acadêmicos Unidos do Rio
               (samba da piranha)

Música: Marco Antonio Carstens Mendonça
Letra: Paulo Robson de Souza




Eu não sou feroz assim.
Eu só dou umas mordidinhas.
Não me culpe se outras mil
têm essa mania minha.
Não sou tão feroz assim, viu?
Eu só dou umas mordidinhas. 
E além disso, meu compadre,
era a vaca mais fraquinha...

Eu não quero mais sofrer,
não pretendo lamentar.
Tenho que me abastecer,
sem remorso me fartar.
Chega de tanto blá-blá,
de ter fama de vilão,
porque tudo o que eu faço
é comer o meu pirão.

Eu não sou feroz assim...

Essa tal ferocidade
que dizem que eu devo ter, 
na verdade, é uma vontade
coletiva de comer.
São milhares de mordidas
para a vaca se acabar
– pouco importa essa má fama,
deixa o povo acreditar... 


Eu não sou feroz assim...

domingo, 30 de outubro de 2016

PORTAS

Música: Calos Piazer
Letra: Paulo Robson de Souza



(clique na foto para ouvir via Face)



Sementes são como portas grossas que se entregam à luz
Que, no retiro da horta, novas histórias conduz.
Embaixo da casca morta, um gás se antevê doçura
Pelas químicas estradas luz captura.

A vida é feita de fracassos e de tentativas
Em volta do milagre de nascer intempestiva.
É a certeza revelando a incerteza do momento
Tênue fio de luz rasgando infindável escuridão.

A vida tem um jeito próprio e descarado
De se fazer de morta – um fato destacado.
Quando se tem esperança, brasa é fogo adormecido
Aguardando um sopro amigo pra rasgar a escuridão.

Não é possível irromper um grito não tendo voz.
No silêncio gris do vácuo é preciso ser tenaz
Jogar fora a casca morta, ser solidão da horta
E na terra se sujar para germinar. 

Sementes são como portas grossas que se entregam à luz
Que, no retiro da horta, novas histórias conduz.
Embaixo da casca morta, um gás se antevê doçura
Pelas químicas estradas luz captura.

sábado, 3 de setembro de 2016

ENTREVISTA AO PROGRAMA CULT.E (TVE)

Entrevista ao Programa Cult.e, TVE MS.
Clique na foto para assistir.


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"O Cult.e é revista cultural semanal da TV Educativa de MS.
Neste programa uma matéria feita na Galeria Dona Neta, que fica no centro de campo grande, e virou um reduto para os apaixonados por tatuagens.
O trabalho de Paulo Robson, biólogo e professor da UFMS, que usa a fotografia e Clayton Sales conta a história do cinema em Campo Grande 
A história de um caminhoneiro que mudou sua vida e passou a construir casa de crianças.
O blog Balaio de Gato de Leandro Marques é o tema da semana na Webserie Por Aí.
O trabalho de Lambert, que usa reciclados eletrônicos como componentes de sua arte, e as dicas culturais para o final de semana.
Tudo isso aqui no Cult.e

O programa Cult.e vai ao ar toda sexta-feira 21h, com reprise aos sábados 11h.


Curta a página do programa www.facebook.com/culte.tvems"

sábado, 9 de julho de 2016

DONA CIDA



Hoje eu serei todo
atenção ao que não
não comungou
não abraçou não sorriu
não disse bom dia ao céu, qualquer que fosse sua cor.

Dona Cida chorou diante de mim, ao meu abraço de gratidão por suas orações para que eu concluísse a tese. Rezou aos pés do Altíssimo, foi o que fez. Contou-me um fato que eu não me lembrava mais, gestos de amizade que se perdem no tempo; decisões que, se para um é natural, para o outro é marca boa que fica. Dona Cida chorou de alegria e, tomada de passado bom, sorriu.

Hoje serei, todo, atenção.

Paulo Robson de Souza

14.4.14

DRAMÁTICA




A mulher declama um poema. Dramática, retira suspiros e ais de verso insosso. Enquanto isso, a poesia bate à porta, pedindo pra sair.

Paulo Robson de Souza

10.5.14

REFÚGIO DOS PENADOS



Buscava entreter seus vícios com coisas de não sei o que fazer. Uma lástima, diriam. Nunca mais conseguiu um nada sequer. Sua teimosia era comprar e comprar; prazeres que não são da carne, não são da alma, prazeres estranhos, esses de encher os olhos de bobagens que imediatamente serão descartadas, nunca usadas.

Dizem que foi dar com as fuças na miséria, tomado de assalto pelas armadilhas da vida.



Paulo Robson de Souza
Ponta Porã, 2.9.2014



RELIGAÇÃO



Refúgio
de sensos perdidos,
inconformismos
próprios da natureza.
É ombro amigo
água
trigo
vento com que arrefece corações.
Religião não é templo.
É tempo.


17.9.2014

Paulo Robson de Souza


CARPE DIEM!



Balançando o esqueleto
lá vou eu colher o dia
ter o sol, reter o vento
aspirar a maresia
sentir a vida, comer
nosso pão de poesia.



Paulo Robson de Souza
16.9.2014





domingo, 3 de abril de 2016

VALSA DA FORMIGA

(Clique na imagem para assistir)




https://www.youtube.com/watch?v=m_djkM0udGc

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Do livro Animais Mais Mais (com CD encartado)

Música: Júlio Feliz
Letra: Paulo Robson de Souza

Intérprete: Angélica Jado Chagas
Flauta: Adriano Praça

Arranjo e produção: Júlio Feliz
Fotos, imagens (celular) e edição:  Paulo Robson de Souza