quarta-feira, 10 de junho de 2015

CASCAS DE PONKÃ


De cascas de ponkã fiz uma geleia "indescritível" – foi como a descrevi ao entregar o pote ao casal de amigos, anunciando-a solenemente e por meio de uma autopropaganda deslavada. Desse modo. Caracterização ambígua mesmo.

Pus a casca róseo-laranja a fermentar durante cinco dias, trocando a água diariamente. Uma pitada de sal, açúcar só no final (pouco), algum cuidado para não queimar o fundo e nenhuma pressa. Dona Lola – a bem da verdade –  foi quem adicionou o açúcar e finalizou o produto. Nem uma lasca de canela, nenhum dente de cravo, nada. Nada mais do que a matéria orgânica desprezada.

Mais doce que o resultado desse empreendimento culinário foi o sorriso dos amigos presenteados.

Impregnado dessa emoção compartilhada, ensaio alguma filosofia de fogão: todo meio de ano milhares de pessoas jogam milhares de cascas dessa pomposa tangerina fora. Lixo que poderia ser transformado num singelo presente manufaturado.

Acho que esse pendor da "tanja" da minha infância para amizades vem de berço: naturalmente pré-fatiada em gomos gulosos, é própria para ser degustada entre amigos. E tangerina madura desnuda denuncia quem lhe tirou as vestes –  êta fruta escandalosa! Com ela, impossível o prazer às escondidas.

Tangerina tem pendores para o prazer grupal.


25/8; 10/9/2005
Foto Paulo R. Souza

Nenhum comentário:

Postar um comentário